A década de 1960 foi
marcada por uma relativização nos valores, práticas e comportamentos no que diz
respeito à sexualidade e as relações de gênero e por movimentos de crítica ao
sistema de produção capitalista. Surgiu neste período um movimento denominado
contracultura, que trouxe uma crítica ao patriarcado e ao capitalismo (Hobsbawn,
1995). Este movimento, que teve causas históricas, sociológicas e políticas,
também repercutiu na esfera da espiritualidade.
A chamada revolução sexual abalou nas bases alguns princípios sob os
quais estavam assentadas a moral e as práticas da religiosidade judaico-cristã,
até então hegemônica no Brasil e no Ocidente. Os jovem buscavam uma “sociedade
alternativa”, através de viagens, militância política, pacifista, feminista ou
ecológica, ou indo morar em comunidades, onde poderiam afastar-se do
capitalismo e experimentar novos modos de vida.
No campo da espiritualidade
tornou-se um símbolo desta emancipação a (re) criação da Wicca, ou bruxaria
moderna. Para seus adeptos, essa religião resgataria as práticas e a
espiritualidade dos antigos Celtas, existentes na Bretanha antes dela ser
conquistada pelos Romanos e converter-se ao cristianismo. Essa espiritualidade
foi denominada pelos cristãos de paganismo, e seus praticantes foram chamados
pagão, termo que hoje é resgatado pelos wiccanianos para denominar a
espiritualidade que praticam. Além da Wicca, existem outros movimentos
religiosos neopagãos, como o Druidismo, o Reconstrucionismo Celta e o Odinismo.
Inicialmente codificada
pelo antropólogo amador Gerald Gardner, nas décadas de 1940 e 50, a Wicca
passou por uma reformulação durante as décadas de 1960 e 70, profundamente
influenciada pelo feminismo. A principal diferença introduzida na Wicca neste
período foi a maior ênfase no culto a Deusa, enquanto que a Wicca Gardneriana cultua
o casal sagrado, a Deusa e o Deus. A vertente da Wicca cuja maior ênfase é o
culto ao feminino é conhecida como Wicca Diânica e é uma das muitas tradições
atualmente existentes nesta religião. O culto a Deusa, promovido pelos adeptos
da religião Wicca inclui práticas ligadas ao sagrado feminino, com a
sacralização da mulher em seus ritos. (Lascariz, 2010: 100).
Segundo Jeanluis Durte
(2008: 140) a emergência e popularização da Wicca na Inglaterra nas décadas de
1950 e 60 está relacionada a perda de centralidade desta nação como principal
influência geopolítica e cultural no mundo do pós-guerra. Ao propor uma
religião ligada aos deuses antigos e anteriores ao cristianismo, Gerald Gardner
e seus discípulos exerceram profundo fascínio na sociedade britânica em crise
com o esfacelamento do Império colonial construído durante o período
Elizabetano.
Bezerra (2012:39) afirma
que é possível perceber os primeiros indícios da presença da Wicca no Brasil na
década de 1980. Nesta década foram lançados no mercado literário nacional
títulos de autores clássicos na literatura sobre Wicca em língua inglesa, e
fizeram sucesso obras de ficção como o romance Brida, do já consagrado
escritor Paulo Coelho, e a tradução dos quatro volumes da obra de Marion Zimon
Bredley, As Brumas de Avalon.
No final dos anos 1990 os
adeptos da Wicca no Brasil buscam uma maior institucionalização com a criação
da Abrawicca, Associação Brasileira de Arte e Cultura Wicca consolidada no ano
2000. A associação iniciou neste período a prática de promover encontros
anuais, como o Encontro Anual de Bruxos e o BBB, Brux@s Brasileiros em
Brasília. A Abrawicca também promove workshops assim como agendas contínuas de
atividades públicas em diversas capitais do pais. A associação participa do
Comitê da Diversidade Religiosa, ligado à Secretaria de Direitos Humanos da
Presidência da República.
Mais recentemente surgiu a Igreja
Brasileira de Bruxaria e Wicca, associação criada também com o objetivo de
garantir direitos civis aos pagãos, visto que há o projeto de uma lei das Igrejas
em tramitação no Brasil. Caso aprovado, este projeto exigiria, entre outras
coisas, que as instituições religiosas estejam organizadas em associações civis
para que sejam legalmente reconhecidas. Como o texto da lei utiliza a palavra
Igreja, trouxe para os adeptos da Wicca a situação contraditória de
precisarem-se agregar sob uma palavra tradicionalmente associada ao
cristianismo. Para isso, apresentam uma justificativa:
Compreende-se que
Igreja é um termo que vem do latim ecclesia – comunidade, assembleia. Sobre
essa questão Mavesper Cy Ceridwen faz a seguinte reflexão: “muito antes de ser
usada por cristãos já era usada no paganismo. Utilizamos o temos não para
designar um órgão de comando de uma hierarquia rígida, porque inexiste isso na
bruxaria. A designação é apenas o que e origem etimológica diz: uma comunidade
para todos[1]
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